As 220 famílias que residem na comunidade de Quilombo Serra Feia, no município de Cacimbas, Centro-Oeste da Paraíba, a 308 km da capital, João Pessoa, vivem quase que exclusivamente da extração do sisal – fibra utilizada para fazer cordas, cordéis, tapetes, placas de gesso e diversos tipos de artesanato. É a única fonte de renda daqueles que conseguem trabalho com os proprietários de plantações de agave (agave sisalana), de cujas folhas se cortam as fibras.
A vida no antigo quilombo se divide em dois períodos distintos: o primeiro, que vai de janeiro a junho, quando o agave está viçoso, pronto para o corte, é tempo de trabalho, chance de receber uns trocadinhos para comprar comida; o outro, de julho a dezembro, é tempo de seca intensa, de uma luta desesperada pela sobrevivência. Os anos passam, as promessas se acumulam, mas a sina é a mesma.
O encarregado Iones Alves Batista, 34 anos, e três de seus 22 irmãos deixaram a terra natal para tentar uma vida melhor no Rio de Janeiro: vieram, se viraram e venceram. Iones e os carpinteiros Geovani, 38 anos; Jorge, 29; e Júlio César, 22, trabalham na Machado Vieira e estão lotados na mesma obra, o Pátio Nazareth, empreendimento da Cury Engenharia, na Zona Portuária.
Uma promessa feita à mãe
“Quando eu era criança, sonhava de, um dia, vir para o Sul também. Nossos conhecidos voltavam com dinheiro no bolso, roupas bonitas e eletrodomésticos. Disse para minha mãe: Quando eu crescer, eu também vou. Ela passou a mão na minha cabeça e me incentivou: Cresça, meu filho, e vá atrás de seus objetivos. O que sou, hoje, devo a ela.”
Emocionado, Iones lembra do diálogo com Dona Maria do Rosário Cassiano Alves, quando ainda usava calças curtas. Com o pai, Genival da Silva Batista, aprendeu o ofício de manusear a temível máquina de agave, que de vez em quando amputa os dedos de lavradores que não possuem carteira assinada, nem estão vinculados ao INSS. Perdem os dedos e o que sobrava de esperança.
“Saí de lá com 17 anos. Estudei até o sexto ano do ensino fundamental. Quando bati nas portas, procurando emprego, fui muito humilhado. Me chamavam de pau-de-arara, barriga verde, caipira, matuto… Diziam que eu não servia nem para carregar uma cangalha no pescoço. Sofri muito, mas fiz uma promessa a mim mesmo, de me tornar um profissional.”
Galinha caipira para todo lado
Iones começou na construção civil como servente. Mais tarde, já nos primeiros anos da MV, foi contratado como meio-oficial. Se esforçou, batalhou muito, e galgou postos até chegar a encarregado de obras. É um dos vitoriosos de Serra Feia e quando retorna para rever os familiares e amigos é motivo de várias festas: “É galinha caipira pra todo lado. Da última vez, voltei com sete quilos a mais!”
Dona Maria do Rosário não cabe em si de tanto orgulho. É coberta de carinhos pelo filho, que volta sempre trazendo um presente para ela e a família. Iones já deu uma televisão, uma geladeira e um fogão, fora os mimos para as onze irmãs, os sete irmãos que vivem lá, os quatro filhos (três do primeiro casamento) e todos os sobrinhos.
O projeto do encarregado, agora, é levar a segunda mulher – Leidiane Lindalva do Nascimento Silva Alves -, com quem é casado no civil, ao altar. A cerimônia acontecerá na terra em que ela nasceu: Orobó, no interior de Pernambuco, a 118 km da capital, Recife. “Ela é a minha grande companheira. É quem me tira dos momentos de tensão e tem sempre a palavra certa para me aconselhar”.
O matrimônio acontecerá na próxima viagem ao Nordeste, ainda sem prazo para acontecer. Os planos, agora, são para receber os quatro filhos que chegam ao Rio em dezembro para passar o Natal e o Réveillon. Vai ter galinha caipira no Rio das Pedras!